sábado, 13 de novembro de 2010
A Visão do Silêncio
03:15
Fonte: ocadernodokaina.blogspot.com
São Paulo é uma cidade conhecida por ser um centro de negócios e também a locomotiva do Brasil. Pessoas de diversos povos, línguas e culturas diferentes moram nesta cidade. Basta passear pela Liberdade, onde nota-se que há uma enorme comunidade de japoneses, ou no Bom Retiro, onde estão os judeus.
Mas há uma comunidade que não passa desapercebida pela sociedade. Trata-se da Comunidade Surda. Os surdos podem ser encontrados no metrô, nas ruas e principalmente nos shoppings. Quem visita as lojas do shopping Tatuapé na sexta-feira à noite e o Santa Cruz no sábado encontrará um grande número de pessoas que usam a Língua Brasileira de Sinais para se Comunicar. Geralmente ficam na praça de alimentação desses locais, sempre no mesmo horário.
Mas uma cidade tão plural e com pessoas tão diferentes às vezes não se dá conta que tem um papel importante na questão da inclusão. Vou contar uma breve história que aconteceu comigo. Eu havia combinado com uma amiga de encontrá-la na estação Brás, para irmos à casa dela. Como sou surda, pedi para meu marido ouvinte entrar em contato com a mãe dela para combinarmos.
Como nunca havia ido para São Paulo sozinha (moro no ABC), perguntei para uma pessoa no trem onde ficava o Brás. É lógico que a pessoa não sabia nada de LIBRAS, e a minha oralidade não é nada desenvolvida. Acho que pronunciei algo parecido com “Brluuuussss”.
Como nunca havia ido para São Paulo sozinha (moro no ABC), perguntei para uma pessoa no trem onde ficava o Brás. É lógico que a pessoa não sabia nada de LIBRAS, e a minha oralidade não é nada desenvolvida. Acho que pronunciei algo parecido com “Brluuuussss”.
Cheguei na estação, mas não parecia muito com o Brás. Mas a pessoa tinha dito que era ali, então fiquei tranqüila. Estava junto com o meu filho de um ano. Havia combinado com a minha amiga às 13 horas, então fiquei ali esperando. Passou meia hora, uma hora e nada da minha amiga. Comecei a ficar preocupada. Daí pensei, “o que faço!? Vou para casa? Fico aqui?”. Pedi para uma funcionária da estação para ligar para o meu marido. Ela ligou, falou algumas coisas que eu não entendi, porque eu não tenho leitura labial. Só nesta hora me dei conta que estava na estação errada! Na verdade estava na estação Luz, e não no Brás. Depois de esclarecido o mal entendido, fui até a estação certa e encontrei com a minha amiga.
Nem preciso dizer que quando cheguei em casa “ouvi” o maior sermão do meu marido. “Meu Deus, Elaine, você já não foi tantas vezes comigo no Brás?!”. Com este argumento disse a ele como eu havia pedido informação para a mulher do trem. Foi nesta hora que meu marido percebeu que eu fiz o sinal certo de Brás e pronunciei algo parecido com “Luzzz”.
Minha mãe ficou louca da vida comigo. Mas azar o dela, já sou uma mulher casada e com um filho nas costas. Ela ficou preocupadíssima comigo. Ora, se a minha amiga demorasse mais eu sei voltar para casa! Às vezes acham que nós surdos somos incapazes. Mas se esquecem que devido a nossa condição, temos um senso de localização muito mais aguçado.
São Paulo deveria ter pessoas que soubessem o mínimo de LIBRAS para nos ajudar em situações como esta. Talvez se houvesse um funcionário devidamente identificado como conhecedor da língua de sinais, eu não teria ido parar na estação errada.
Autor: Elaine Borges de França Pereira, com a colaboração de Osmar Roberto Pereira
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